quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Cursos livres: contrato ajuda a evitar dor de cabeça

Fonte: O Globo - Defesa do consumidor


- Balé, judô, capoeira, natação, inglês, espanhol, artes, música. Janeiro é tempo de fazer matrículas em diferentes cursos, para crianças ou adultos. E na hora de decidir em qual entrar, o consumidor tem de estar atento para não ter sustos ao longo do semestre ou no fim do período. Reposição de aulas, trancamento, taxas extras para participação em apresentações. Todas as regras e custos relacionados a uma atividade devem estar expressos em contrato e uma cópia desse documento tem de ser entregue ao consumidor.

Atividades físicas e culturais, por exemplo, geralmente fazem apresentações de fim de semestre. Os custos desses eventos, que as instituições dizem que são opcionais, só costumam ser informados semanas ou dias antes de sua realização, ficando de fora do orçamento planejado no momento da contratação da atividade. Segundo especialistas em direito do consumidor, isso é ilegal.

Enquete no site da Defesa do Consumidor, perguntou aos internautas se já haviam recebido contrato ao entrarem em cursos livres. A grande maioria afirmou que não: 77%. Outros 8% disseram ter recebido em alguns casos, enquanto 15% afirmaram que sempre receberam o documento.

Leila Cordeiro, assessora técnica do Procon-SP, explica que o consumidor tem de receber contrato com todas as especificações, como forma de pagamento e cláusulas de rescisão, trancamento, reposição, gastos extras, além de direitos e deveres de ambas as partes.

- É importante o consumidor ter o documento para saber o que foi contratado. E as regras válidas são as do Código de Defesa do Consumidor (CDC), porque se trata de prestação de serviço. Parar ou não nas férias, por exemplo, depende das regras do contrato. O consumidor tem de ter ciência prévia do que pode ou não - diz Leila, acrescentando que essas regras valem para qualquer curso livre.

Constrangimento de alunos

A professora universitária Ana Lúcia Rangel sempre se incomodou com a falta de contrato nas aulas de balé de sua filha e de clareza quanto às apresentações opcionais de fim de ano:

- Faz-se uma ficha de inscrição, seguida do pagamento da matrícula e da mensalidade. O pagamento é antecipado, antes de o serviço ser prestado.

Outro problema, diz Ana Lúcia, é o fato de as aulas terem um tempo dedicado ao ensaio da coreografia da apresentação de fim de ano, o que praticamente obriga as alunas a participar da tal apresentação e rouba o tempo de aula contratado para algo dito opcional.

- Além de pagar uma taxa para participar da apresentação, que segundo a academia é para despesas com a fantasia e o teatro, temos que comprar ingressos para assistir. Pior de tudo é a imposição à participação e o constrangimento a quem não vai participar, porque os pais, muitas vezes, não podem ou não concordam em arcar com este custo extra, que não estava no contrato.

Leila diz que custos de apresentações e trocas de faixa, por exemplo, têm de estar informados no contrato. Até porque são eventos que fazem parte do curso e não são opcionais como as instituições afirmam.

- O que ocorre: se não pagar, não muda de faixa? Isso é absurdo. O pai ou a mãe pode não ter dinheiro para pagar. É preciso estabelecer regras para que o curso seja finalizado com tudo a que o aluno tem direito. Além disso, se não estiver explicitado o valor da atividade “opcional” no contrato, o consumidor não tem obrigação de pagar nada a mais e pode participar - afirma.

A produtora de eventos Roberta Werner optou por deixar suas três filhas, de 10, 8 e 6 anos, de fora das apresentações de balé e de capoeira da escola. Até o ano passado, as meninas estudavam no Ciei, no Recreio. Lá, todas as atividades estão incluídas na mensalidade. Portanto, a participação nas aulas era obrigatória.

- Dá uma dor no coração, é constrangedor. Mas gastar R$ 180 para a criança dançar cinco minutos não faz sentido. Esse valor é mais de 10% dos cerca de R$ 1.600 da mensalidade da escola. Pagar R$ 100 pela nova corda da capoeira também é demais - critica Roberta, que optou por trocar as meninas de escola.

Carlos Alves da Silva, o Carlito, sócio administrador do Ciei, diz que a escola não ganha um centavo com eventos dessa natureza. Mas afirma que, “por ingenuidade”, nunca inseriu os custos extras relativos a atividades complementares no contrato e que o fará a partir do ano que vem:

- Os professores responsáveis pelas atividades complementares dizem quanto custa o evento e demonstram. Além disso, a fantasia do balé pode ser feita fora da escola. Nunca inserimos isso no contrato porque era um ponto considerado irrelevante. Os contratos de 2014 já foram assinados. Mas nos de 2015 haverá esse complemento.

Informações no recibo

Mas Roberta, que também é mãe de um menino, não vivenciou esse problema apenas no Ciei. Suas três filhas também fazem balé fora da escola, na academia Bodytech, e lá também foi cobrada uma taxa de mais de R$ 100 pelas fantasias para apresentação de fim de ano, sem que isso estivesse informado em contrato. A atividade custa mensalmente cerca de R$ 200. Conclusão: as meninas não participaram da apresentação.

- O papel que recebi em casa tinha uma observação alertando que quem não pagasse não poderia participar. Isso é um absurdo. Se a gente sabe antes, pode se planejar financeiramente.

Em nota, a Bodytech informou que apresentações de balé e trocas de faixa de judô, bem como os valores envolvidos nesses eventos, não são expressos em contrato porque são de caráter excepcional e participação facultativa dos alunos.

Hugo Filardi, sócio do escritório Siqueira Castro, explica que o consumidor deve perguntar todas as condições da prestação do serviço no momento da contratação, para segurança de ambas as partes.

- Lacunas geram embaraços para ambos. O fornecedor tem o dever de descrever qualquer prática inserida no bojo daquele serviço. Não se pode ser surpreendido no fim.

O advogado ressalta que, caso não haja contrato, o consumidor pode ser informado no recibo ou num e-mail sobre o que está sendo oferecido. Já Leila lembra que, em caso de cláusulas abusivas, pode-se fazer ressalva no próprio contrato ao assiná-lo ou enviá-las por e-mail, por exemplo.