segunda-feira, 31 de março de 2014

Marco Civil da Internet: finalmente, um passo adiante – mas a agenda ainda continua em curso

Por André Luiz Lopes do Santos e Maíra Feltrin Alves*


Depois de incontáveis idas e vindas, o Projeto de Lei 2126/11, o chamado “Marco Civil da Internet”, foi finalmente aprovado na Câmara dos Deputados e, agora, seguirá para votação no Senado Federal.

A regulamentação do uso da Internet, bem como das relações estabelecidas nesse ambiente, tem implicações cada vez mais claras e relevantes no cotidiano de milhões de cidadãos e, claro, de consumidores.

O texto aprovado consolida uma série de fundamentos e princípios de extrema importância, dentre os quais a defesa da livre iniciativa e da livre concorrência, colocados em pé de igualdade com a defesa do consumidor que, em ponto de destaque do texto aprovado, aparece como efetivo limitador da liberdade de empresa, na medida em que, em havendo relação de consumo nesse ambiente, há de prevalecer a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, cabendo a aplicação apenas subsidiária do Marco Civil, em tais hipóteses – em termos práticos, vale dizer, preserva-se a liberdade de iniciativa e a conseqüente formatação de modelos de negócio diversos, mas, sempre, respeitados os princípios e limites decorrentes das normas de proteção e defesa do consumidor.

O Marco Civil foca, ainda, a preservação da estabilidade, segurança e funcionalidade da rede, bem como sua neutralidade – tema tão caro à defesa do consumidor, em todo o processo de discussão e construção dessa norma. Embora a questão dependa ainda de regulamentação presidencial posterior, fica adstrita a limites importantes, não se admitindo, como regra, a segregação do usuário/consumidor, que só poderá acontecer em caráter de exceção, para situações de emergência e em virtude de requisitos técnicos indispensáveis à adequada prestação dos serviços, evidenciando-se aí a preocupação com a manutenção de qualidade e igualdade no acesso à internet: direito consagrado e sempre solicitado no âmbito das relações de consumo.

Mais ainda, vale destacar a expressa menção do texto legal à proteção da privacidade e de dados pessoais, na forma da lei – que ainda não está posta, infelizmente.

A Internet, bem sabemos, permeia de modo crescente e sempre mais aprofundado o cotidiano dos cidadãos. Nesse contexto, o trânsito de nossos dados pessoais, nesse ambiente, mostra-se não apenas intenso e detalhado, mas, em especial, rico o bastante para despertar o interesse central de todo o mercado. Nossos dados pessoais (dentre os quais nossos hábitos e perfis de consumo) são, cada vez mais, o centro das atenções de inúmeros ‘modelos de negócio’, que se multiplicam e se inovam a uma velocidade inimaginável.

Em tempos de big data, a proteção dos dados pessoais não pode representar mais, apenas, ‘uma questão relevante’; ela representa (ou deveria representar, ao menos) uma premissa. Sem uma lei geral de proteção de dados pessoais, estamos órfãos, diante das aparentemente inesgotáveis possibilidades que os sistemas tecnológicos de tratamento de dados oferecem para compilar, analisar e orientar ações das mais diversas - a serviço, também, dos interesses mais variados, evidentemente.

Fica aqui o registro de que quem quer se empenhe na defesa dos direitos dos consumidores (e, em sentido mais amplo, da cidadania), não poderá se dar por satisfeito sem que, “na carona” da aprovação do Marco Civil da Internet, vejamos ser retomado e voltar a caminhar – a passos largos, de preferência – o Projeto de Lei de Proteção de Dados Pessoais, já amplamente debatido e aperfeiçoado, ao longo dos últimos anos.

André Luiz Lopes do Santos é assessor chefe da Diretoria Executiva da Fundação Procon-SP

* Maíra Feltrin Alves é assessora técnica da Diretoria de Programas Especiais da Fundação Procon-SP