segunda-feira, 7 de abril de 2014

Redução da aplicação de multas a planos de saúde enfraquece regulação, avaliam entidades

Fonte: O Globo - Defesa do consumidor

O assessor-chefe do Procon-SP, André Santos, disse que as entidades de defesa do consumidor que participam nesta quinta-feira de reunião do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), em Brasília, foram pegas de surpresa com a proposta da Câmara para que as operadoras paguem menos multas, conforme antecipou O GLOBO na edição de hoje. Ele classificou a medida como "absolutamente inadequada", pois na avaliação do Procon-SP, a sanção por meio de multas é uma das "poucas medidas efetivas" de punição aplicadas pela Agência Nacional de Saúde (ANS) nas operadoras.

- A nova regra enfraquece o poder regulatório da agência, que já não tem conseguido manter o equilíbrio das relações entre planos e consumidores - analisa Santos.

A mudança foi inserida na Medida Provisória (MP) 627 pelo relator Eduardo Cunha (PMDB-RJ). 

Hoje, as operadoras pagam multas que variam de R$ 5 mil a R$ 1 milhão por infração cometida multiplicada pelo número de ocorrências. A MP determinou que até 31 de dezembro deste ano, para infrações de mesma natureza será considerada apenas a multa de maior valor. Na prática, a operadora que cometer de duas a 50 infrações da mesma natureza, terá pena equivalente a duas infrações. De 51 a 100 descumprimento da regulação, a pena será como se fossem apenas quatro infrações. O último patamar é o que considera o pagamento de um número superior a mil multas. Neste caso, o plano de saúde pagará apenas como se tivesse cometido 20 infrações do maior valor.

Santos critica, ainda, a argumentação do relator da MP, que justificou a mudança afirmando que hoje, o modelo de aplicação de multas é "exagerado", e que, por exemplo, "é absurdo a aplicação de 200 multas no mesmo evento".

- Absurdo é uma operadora cometar mil vezes o mesmo erro e seguir atuando sem sanção que surta efeito - rebate o assessor-chefe do Procon-SP.

Ele lembra, ainda, que esta norma não foi discutida com a sociedade, e que não faz o mínimo sentido ela ser incluída em uma MP sobre outro tema completamente estranho à saúde: a tributação de empresas no exterior

- Isso é um sinal que não querem dialogar. Todos nós do Sistema de Defesa fomos pegos de surpresa com isso.

A advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Joana Cruz, disse que a 
entidade também é contrária à proposta, porque além de estimular a reincidência de infrações e a impunidade, está em desacordo com "o recente trabalho da ANS em estimular o cumprimento de prazos de atendimento e de cobertura de procedimentos por meio do monitoramento de garantia de atendimento".

- A alteração prejudicará o consumidor e está em desacordo com os princípios da Política Nacional das Relações de Consumo, instituída pelo Código de Defesa do Consumidorcomplementou Joana.

Para a advogada especialista em Direito à Saúde, Renata Vilhena, este novo modelo tira o incentivo do consumidor de registrar reclamação junto à ANS, "porque ele não terá certeza 
que a multa será aplicada".

- De acordo com matéria publicada na Revista do Idec, a ANS, de 2009 até 2013, aplicou 6.575 multas no valor de R$ 819.507.668,66; e só recebeu 1.525 multas no valor de R$ 109.986.121, 86. Ou seja, 13% do total aplicado. Com esta proposta o valor será ainda menor, o que demonstra claramente a captura da agência reguladora pelo poder econômico. O sistema funciona cada vez pior, sob o manto protetor da ANS - complementa a especialista.

A ANS informou que, juntamente com o Ministério da Saúde, está analisando o conteúdo das emendas feitas à MP e reiterou que a proposta não partiu da agência, mas do Legislativo.

Procuradas para comentar o assunto, as duas entidades que representam as operadoras de planos, Abramge e Fenasaúde, informaram que só vão se manifestar após a tramitação final da MP.